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Foto de Marx e o fetiche da mercadoria

Fragmentos de leitura de
Marx e o fetiche da mercadoria:
Contribuição à crítica da metafísica

Por enquanto até a pág. 26

 

Há uma metafísica encarnada, objetivizada, que tem no seu centro o dinheiro enquanto mercadoria das mercadorias. Marx se dispõe a combater essa metafísica — que é para ele carregada de uma espécie de religiosidade. A metafísica objetivizada está ligada a abstrações e indiferenciações e universalizações.

EU — Concordo até aqui com tudo o que Jadir Antunes diz de Marx e com tudo o que Marx diz, se Jadir Antunes está correto. Inclusive compartilho a tomada de posição antimetafísica. Ou concordo com quase tudo: não creio que o centro de toda essa metafísica esteja no dinheiro, e sim no processo de concentração de poder, do qual a concentração de poder econômico, na forma de dinheiro, é apenas uma de suas formas. As formas de poder trascendem o campo econômico.

A abstração, indiferenciação e universalização de que Marx fala, além disso se resume muito bem , em todas essas facetas tomadas em conjunto, naquilo que Proudhon chama de "absolutização". Abstração de relações componentes internas e externas em que a coisa absolutizada se simplifica, se generaliza e se magnetiza, torna-se atraente (atraente por suas implicações como parte de processo de concentração de poder, no meu entendimento). É de se notar também que essa consideração de um Marx que combate processos de abstração crescentes no mundo à nossa volta reaproxima Vilém Flusser de Marx de maneira muito consistente.

ANTUNES — Segundo Jadir Antunes, Marx considera que algo só aparece a alguém na medida em que é externo a esse alguém, e a mercadoria aparece como coisa externa que precisa ser possuída para que possa realizar sua utilidade como unidade de riqueza.Na verdade se exterioriza como produto do trabalho, mas o processo de exteriorização se oculta.

O ocultamento se dá pela passagem do trabalho concreto ao trabalho abstrato e indiferenciado enquanto valor de troca (o trabalho concreto produzia valor útil). O valor de troca é o valor de mercado, é o valor que aquilo tem enquanto mercadoria.

O desenvolvimento econômico pressiona o trabalhador produtivo no sentido de incorporar a seu trabalho a lógica do capitalismo e do mercado: a princípio sua produção tem valor útil, mas logo passa a ser pressionado pelas conjunturas a produzir já visando troca, produzir mercadoria (produto para o mercado). Isto significa produzir algo que seja trocável, portanto levar em conta algum denominador comum às mercadorias todas que vão sendo trocadas. Esse denominador comum é o trabalho abstrato, geral e indiferenciado, medido apenas pelo tempo de trabalho despendido.

Com isto, começa a exteriorização subjetiva do trabalho na forma de trabalho alienado, não mais existencial e incorporado à vida, mas feito para algo externo que é o mercado. Começa um processo de transformação no trabalho que o desumaniza fazendo dele próprio algo exteriorizável e "trocável", uma mercadoria em potencial.

"O próprio termo mercadoria é uma abstração e nos remete aos domínios da Metafísica. Ao contrário do casaco e do linho que são um isto e um ente sensível, a mercadoria não é um isto. A mercadoria é a abstração, a negação e a despersonalização de todas as qualidades sensíveis e naturais do isto da riqueza. A mercadoria, por isso, é uma forma e um ente suprassensível por excelência" (ANTUNES, p. 26)

EU — Digo que, ao contrário do que Marx parece sugerir, o sensível nunca é dissociado de alguma parcial subdeterminação suprassensível. Mas de um suprassensível cultural e psicológico, e não metafísico. (Marx, segundo a linha de leitura de Antunes, consideraria qualquer suprassensível como metafísico, o que não deixa de ser um modo interessante de pensar, confesso... mas neste caso, considero a presença de alguma margem de metafísica insuperável no que quer que simplesmente exista para os seres humanos).

Digo ainda o seguinte: a forma "objeto" ou "coisa" é tão abstrata quanto a forma "mercadoria", e não menos. A forma "produto" igualmente. Apenas a forma "forma" está apegada a um "isto" particular, e somente se compreendemos essa "forma" como conjunto particular de características — que é o que faço. Marx entende "forma" num sentido modal: algo pode para ele assumir muitas formas. Uma forma é para ele um modo pelo qual algo se apresenta, ou mais precisamente uma modalidade de aparência de algo.

Também entendo "forma" em sentido modal mas não da mesma exata maneira, porque para mim as coisas, do ponto de vista do que nos é humanamente acessível nelas, "são" formações, isto é, formas em processo de variação e mudan;ca. Uma forma só é uma abstração no sentido de que é um recorte estável nesse jogo de variações e mudanças da formação, mas já não é uma abstração pura no sentido de que não é puramente imaginária, e sim um recorte a que somos induzidos por uma marcação rítmica, digamos assim, nesse processo contínuo de mudanças e variações: em outros termos, o que nos induz a recortar imaginariamente uma forma estática numa formação que se processa é o modo como ela um pouco mais duravelmente se apresenta em certos momentos ou circunstâncias.

Uma "forma" para mim é um conjunto de características com que algo se apresenta em um certo momento ou circunstância, e não uma aparência que encobre algo inaparente dando-lhe contornos específicos. E acho que Marx força a mão ao tentar mostrar a mercadoria como algo que encobre e oculta as características do bem produzido: digo que uma mercadoria não é (não tem como ser) propriamente "mercadoria" sem a consideração das caracterísiticas particulares daquela particular mercadoria. Sem o "isto" de que jadir Antunes fala, ela não assume a forma mercadoria. Portanto, não é nessa forma que está o que oculta o trabalho humano nas relações sociais.

E digo isto porque a forma mercadoria é a antecipação imaginária e invertida da posse de algo que traz algum poder — coisa que Marx não percebeu. E esse algo traz algum poder específico precisamente em função da forma (das características) que lhe dão alguma utilidade.

É enquanto instrumento previsto de poder geral e abstrato, transferível de uma forma de poder para outra, que ocorre a abstração. Em termos de poder especificamente econômico, ela ocorre mais em torno da propriedade do que em torno da mercadoria — o que significa que recuso precisamente a marca de originalidade de Marx em relação a outros pensadores anticapitalistas como Rousseau, Proudhon e Stirner, especialmente esses dois últimos. Ocorre mais ainda em torno da apropriação enquanto processo e conjunto de procedimentos e relações sociais (e entre coisas). Marx acertou em sua crítica à existência de um processo que é ao mesmo tempo de abstração e coisificação. Errou de alvo ao tentar localizar a gênese desse processo.

Digo que errou de alvo porque estava focado em uma visão centralista, governamental, no campo da economia — uma visão já de saída intervencionista que visava inrevenção de cima para baixo, após tomada do poder político.

Digo que o poder está intrinsecamente conectado à eficácia — e mor meio dela aos meios de ação eficaz, isto é, à técnica e à tecnologia. (O que não quer dizer que o inverso seja válido, porque se todo poder se liga à busca da eficácia não significa que toda busca de eficácia se ligue à concentração do poder.) O poder está também intrinsecamente ligado ao processo de sua acumulação, que se estrutura em variadas formas cada qual com suas aparelhagens e leis (ou programas) de desenvolvimento. E está, finalmente, intrinsecamente ligado a uma margem crescente de ignorância quanto à realidade externa ("idiotice", em sentido etimológico) e com ela, ligado a uma margem também crescente de perda de base de sustentação desse mesmo poder, conduzindo dialeticamente ao aumento de probabilidade de sua derrubada. Trata-se portanto de uma eficácia buscada por meios contraditórios que tendem a levá-la ao colapso. Essa ignorância do real (ou "idiotice") por sua vez está intrinsecamente conectada ao que Proudhon chama de "absolutização" (processo de abstração generalizante) — de modo que esse meu raciocínio pessoal conduz mais uma vez de Marx a Proudhon, e à preferência deste último como referência.

ANTUNES — entretando o argumento de Marx quanto à transcendência metafísica da mercadoria, segundo Jadir Antunes, vai mais longe.

"Como coisa externa, a mercadoria é ao mesmo tempo uma coisa separada do agente que a deseja consumir. como coisa externa é coisa que precisa, por isso, ser primeiramente tomada e possuída para que seja capaz de satisfazer uma necessidade humana, seja esta necessidade originada no estômago ou na fantasia. Por ser uma coisa externa ao homem a riqueza como mercadoria já aparece aqui como algo transcendente e metafísico" (ANTUNES, p. 26)

EU — Eu responderia o seguinte: todas as "coisas", mercadorias ou não, têm esse mesmo aspecto transcendente e metafísico, na medida em que ek-sistimos (sendo aqui heideggeriano e flusseriano) fora delas e projetados em direção a elas e a outros de nós, assim como elas projetadas umas em direção às outras e em direção a nós.

Se Marx diz isto especificamente da mercadoria, é porque está tentando diferenciá-la do produto não-eferecido para troca no mercado. A exterioridade deste para a mercadoria, a meu ver, só aumenta de grau. O elemento qualitativamente novo que surge na mercadoria é a oferta de um poder de uso da mesma mediante a troca.

O fato de ser oferecida para troca gera apenas a diferença no grau de distanciamento: o produtor se dispõe a abrir mão do produto em troca por outra coisa, e essa predisposição já é um primeiro passo que amplia a exteriorização (do primeiro a um segundo passo, o produtor pode dizer a si mesmo que aquele produto já não é propriamente "seu" para usofruto e consumo, ele se aliena subjetivamente de sua posse sobre o produto embora objetivamente ainda a tenha). Estamos aqui, mais uma vez, numa dinâmica da posse e da propriedade (ou processos de apropriação e afins) muito mais do que numa dinâmica centrada na mercadoria em si.

Toda a questão está em saber se os elementos alienantes envolvidos na forma-mercadoria podem ou não ser compensados e corrigidos por aparatos e forças de gerenciamento do mercado, e minha resposta é: sim, podem, e por aparatos e forças que não são necessariamente estatais e podem nem passar pelo Estado. (Na verdade podem até mesmo passar em larga medida por formas de vivência que estão para além de toda formalidade e oficialidade no gerenciamento dessas coisas, e que subvertem criativamente essa formalidade e essa oficialidade — mas este é um campo de estudos mais complexo, em que podem ser úteis referências como Foucault e outras ligadas direta ou indiretamente à psicologia.)

É interessante notar que a oferta do poder de uso inscrito numa mercadoria acaba se realizando, no processo de consumo pós-compra, em sentido oposto do esperado para a imensa maioria da população: ocorre uma mais-valia que pesa sobre o consumidor ainda mais que sobre o trabalhador (ou sobre a face "consumidor" das pessoas mais do que sobre sua face "trabalhador").

Primeiro porque o consumidor é programado para comportamentos pró-acumulação de poder econômico (ou de poder em outras formas), de modo que no próprio processo de consumo ele é levado a "trabalhar" cotidianamente em favor disso com pouco ou nada em troca. Segundo porque seu consumo tende a se configurar como participação  gratuita no marketing do produto. E terceiro pelos excedentes nos preços e pelo endividamento, que tantas vezes também ocorre.

Importa entender os processos que resultam nessa situação.

Marx examina a mercadoria primeiro por meio de "Analyse", levantando seus elementos componentes quando ela só é observada abstratamente, isoladamente, antes da troca por outras mercadorias.

EU — Note-se: para Marx, o que é examinado isoladamente está sendo examinado abstratamente, sendo retirado imaginariamente de um contexto que é o de sua existência concreta. Mas parecem existir para eles abstrações objetivas a serem combatidas, abstrações que não são imaginárias, que não estão na subjetividade do imaginário humano — portanto realidades objetivas que de algum modo se desconectam de suas relações originais no contexto isolando-se dele em alguma medida. É uma perspectiva interessante — na verdade mais uma vez até certo ponto já presente, em outros termos, em Proudhon, no livro Da criação da ordem na humanidade ou Princípios de organização política, de 1843, em passagem onde ele faz um balanço de suas próprias contribuições para a lógica e os métodos de raciocínio disponíveis na humanidade.

Concordo com esse modo de considerar o abstrato e o concreto e com essa noção. Exceto que a consideração do contexto sem a consideração dos componentes me parece igualmente abstrata (ou "absolutizante" para usarmos termos proudhonianos), apenas em sentido inverso, centrífugo. Digo que há abstração centrífuga e centrípeta.

E diria, com Heidegger, que a própria existência das coisas e dos seres vivos é vazada em abstração, por existirem "fora" umas das outras e "projetadas" umas para as outras (e digo fora ou saindo de si mesmas). Mas considero essa abstração da existência das coisas sempre parcial e oscilante, e variando de sentido de projeção, de uma direção para outra, carecendo de um mapeamento vivo que as acompanhe, e não de um desvendar definitivo de alguma "estrutura" oculta.

Contudo isto não parece exatamente discordar de Marx (essa ideia do mapeamento de acompanhamento), pois ele não pretende estar descobrindo algo "definitivo" e sim uma estrutura historicamente situada.

De qualquer modo não deixa de haver um ponto de discordância aqui: Marx escolhe a mercadoria porque julga que no Capitalismo a riqueza aparece como "uma imensa coleção de mercadorias". Discordo. Ela aparece como poder econômico, como poder de ação (virtual ou realizada), gerado por meio da apropriação de capital (mercadoria em seu estado mais suprassensível). Um poder de ação que se manifesta no uso do capital acumulado, afetando fenomenicamente a realidade ao redor.

A escolha da mercadoria por Marx ao falar em "uma imensa coleção de mercadorias" é uma fuga fácil da complexidade do fenômeno, isto é, da complexidade da aparência sensorial e imediata da riqueza. Porque ela se apresenta sensorial e imediatamente como efeito sobre a realidade em seu uso, em sua projeção para fora rumo às coisas, portanto já diretamente em relação e não em algo que tenha uma forma elementar sensível para passar por "Analyse".

Se marx partisse diretamente de uma "imensa acumulação de capital" estaria um pouco mais perto do que estou afirmando, mas então já estaria falando de algo suprassensível num altíssimo nível de abstração — pois o capital, segundo minha compreensão, é em sentido geral e abstrato tudo aquilo que, indiferentemente, possa ser trocado por dinheiro.

Considero o capital como instrumento de ação da riqueza. Que a riqueza se manifesta sensorialmente já nas relações que estabelece ao seu redor, e que o recorte para tomá-la in-abstracto para uma análise é, por isso mesmo, mais difícil de realizar, mais trabalhoso.

Mas não preciso deixar de, paralelamente a esse trabalho, dialogar com Marx fazendo também a análise da mercadoria (e acrescentando correções à dele) para colocá-la em seu correto lugar na sua relação com o poder econômico (isto é, com a riqueza que se acumula). É preciso entender a relação entre a riqueza em sua forma sensível (poder econ6omico de ação) e seu instrumento maior que é o Capital (sua forma mais abstrata) — e entender essa relação sem confundir uma coisa com a outra. Em meu entendimento Marx percebeu que o Capital é a forma mais abstrata por um lado do poder econômico e por outro da mercadoria. Mas não se deu conta de que uma mesma forma abstrata pode ser comum a coisas diferentes.

Mercadoria não é poder econômico. Posse de percadorias já é poder econômico virtual, e essa, por exemplo é uma distinção fundamental ocultada na colocação de Marx. "Quem" possui não é necessariamente uma pessoa nem mesmo uma coletividade. Mas a instância que pode exercer poder econômico por meio dessa posse. Esse poder econômico constitui a riqueza dessa instância possuidora, poder que pode manejar esse capital na forma de mercadoria para se exercer.

ANTUNES — Segundo o Marx de Jadir Antunes, se a mercadoria é uma abstração suprassensível, o dinheiro é

"a abstração da abstração, como a negação da negação e a despersonalização da despersonalização. O dinheiro fundará, deste modo, um mundo e um modo de vida inteiramente abstratos e despersonalizados" (ANTUNES, p. 26)

No entanto ao mesmo tempo o dinheiro é material (metais preciosos) e por ser "sensível-suprassensível" se apresenta como "o Absoluto, como o Deus das mercadorias" (pa. 26) puxando tudo para o campo metafísico-religioso.

EU — Esta passagem ainda precisa ser esclarecida por Jadir Antunes em todos os seus passos. Não está clara:

Diria de minha parte, desde já, que o que funda um mundo e uma vida cada vez mais abstratos é a técnica e a tecnologia , conectadosà busca de eficácia, e de uma eficácia por sua vez conectada aos processos de acumulação de poder. Isto deriva do fato de que no processo de acumulação de poder este se distribui desequilibradamente, e onde está baixo, ps envolvidos são abstratamente divididos para coisificação e instrumentalização de suas partes.

Flusser observa nessa crescente abstração uma projeção das culturas religiosas judaica e cristã no perfil das tecnologias. Eu observo nisto, de minha parte, uma absolutização (em sentido proudhoniano) e um jogo de apropriações e possessões (em sentido stirneriano) — que caracterizam diretamente as relações de poder e também indiretamente (através de influência direta nas técnicas e tecnologias), e também indiretamente por outro meio: através da caracterização do próprio perfil das culturas religiosas, já observado por Flusser, culturas que por sua vez interferem sim na técnica e na tecnologia. Portanto concordo com Flusser, mas afirmo que "o buraco é mais embaixo" — ele erro o alvo quanto à gênese da coisa, que não está centrada só na religiosidade, que é só um dos elementos). A gênese da coisa é melhor detectável por uma combinação de Proudhon, Stirner e Nietzsche.

Há processos de acumulação de poder, que desequilibram a distribuição do mesmo (Nietzsche o detectou mas não destrinchou passo a passo esses processos enquanto processos objetivos, sensorialmente captáveis).  Esses processos estão diretamente conectados a absolutizações (Proudhon) e a jogos de apropriação e possessão (Stirner) nas relações entre esses focos concentrados de poder (com suas respectivas absolutizações), e de outro lado há o real, que é relativo e relacional.

Esses jogos de apropriação e possessão se dão em função do empenho de energia, por parte dos focos de concentração de poder, no sentido de instrumentalizar o real em favor de maior concentração. É essa instrumentalização que passa pela tecnização e tecnologização das ações sobre o real, que vai sendo absorvido como parte da própria instrumentação que age sobre ele (vai sendo apropriado por ela).

Esta é minha perspectiva.

ANTUNES — Para Marx, Mercadoria e capital aparecem (nos economistas) como "coisa" externa à ação humana, com funcionamento próprio do qual somos alienados, afastados.

EU — Aqui não discordo, exceto pelo fato de que, como já disse, a própria existência do que quer que weja incorpora sempre, segundo percebo, algum grau de uma flutuante "alienação" em relação a tudo o mais ao seu redor (e acrescentaria que até em relação a si mesmo)... E considero que há graus nas exteriorização das mercadorias em relação à ação humana (dos humanos enquanto produtores e enquanto consumidores) — e graus que variam de caso para caso. çonsidero que apenas a partir de um certo grau de exteriorização a mercadoria se autonomiza.

Também já disse que considero a mercadoria (num nível mais abstrato o dinheiro, e num ainda mais abstrato o capital) como instrumento (aparato técnico/tecnológico) do poder econômico. Digo então agora que  não é apenas a mercadoria que tende a se exteriorizar mais e mais e se autonomizar em relação à ação humana, mas todos os aparatos e aparelhos técnicos ou tecnológicos. Por exemplo aparelhos institucionais. Todos tendem a isso conforme atuem a serviço de qualquer das formas de acumulação de poder — e não apenas do poder especificamente econômico.

Podemos apenas dizer que no capitalismo clássico o poder em sua forma econômica é predominante. Mas estamos ainda em uma forma"clássica" de capitalismo? Acho que não.

Acho que vivemos um capitalismo mesclado a outros "ismos", em que as diretrizes de acumulação de poder econômico sofrem muitas interferências e mudanças de rumo adaptando-se a elas para poder seguir em frente de modo a tirar o maior proveito, e que para isso precisa se ajustar a outras formas de acumulação de poder, ou abrir canais em que o poder possa fluir melhor de uma forma para outra, expandindo-se de uma a outra.